Pesquisadores descobriram mais de mil novas espécies de microrganismos nas fezes de animais tibetanos, capazes de decompor celulose e reduzir as emissões de metano

A nova arma secreta da China na corrida biotecnológica: fezes de animais tibetanos com micróbios recém-descobertos Nas planícies geladas do Tibete-Qinghai, uma vasta área conhecida como o «Terceiro Pólo», um grupo de investigadores chineses descobriu um recurso biológico tão inesperado quanto valioso: um microbioma escondido nas fezes dos animais herbívoros locais.

O que à primeira vista parece um resíduo insignificante revelou-se um verdadeiro ecossistema repleto de microrganismos desconhecidos, muitos dos quais possuem funções que podem transformar setores-chave como a biotecnologia, a agricultura e a mitigação das consequências das alterações climáticas. A equipa identificou bactérias capazes de decompor celulose com alta eficiência — um processo de importância central para as indústrias de papel e têxtil —, bem como estirpes que demonstram uma capacidade promissora de reduzir as emissões de metano da pecuária, uma das principais fontes de gases de efeito estufa.

A isso se soma a descoberta de novas sequências genéticas que podem ser usadas para desenvolver novas ferramentas de edição genética, peptídeos antimicrobianos e compostos biotecnológicos de última geração. À medida que a concorrência global na área da inovação em biologia sintética se intensifica, este recurso oculto de biodiversidade microbiana é considerado pela comunidade científica chinesa como um recurso estratégico.

Um mapa sem precedentes do microbioma

A investigação realizada no âmbito da Segunda Expedição Científica ao Tibete foi um marco importante. Investigadores da Universidade de Yunnan e da BGI-Research recolheram, ao longo de cinco anos, mais de 5000 amostras de excrementos frescos de seis animais herbívoros emblemáticos: iaque, ovelha tibetana, antílope, vaca, cavalo e kiang. Das primeiras 1412 amostras analisadas, cerca de 88% das espécies microbianas eram completamente desconhecidas. Esta é uma percentagem surpreendente, mesmo para regiões megadiversas, o que confirma a singularidade ecológica do «Terceiro Polo».

O investigador principal, Zhang Zhigang, destaca a importância estratégica dessa diversidade: quem conseguir caracterizar e patentear essas funções poderá liderar uma nova geração de enzimas industriais e ferramentas de biologia molecular. E isso não é exagero. Tecnologias globais, como o CRISPR-Cas, nasceram precisamente da investigação de microrganismos extremófilos. A busca por variantes mais estáveis, precisas ou ativas é uma prioridade para todos os laboratórios de engenharia genética.

Enzimas para um mundo com menos resíduos

As primeiras pesquisas mostraram que muitos desses animais, adaptados a condições extremas com vegetação escassa e pobre em nutrientes, são portadores de bactérias altamente especializadas na decomposição da celulose. Esses enzimas podem melhorar os processos de produção de papel reciclado, fabricação de tecidos vegetais e até mesmo abrir caminho para biocombustíveis de segunda geração, onde a celulose é convertida em açúcares fermentáveis. Esta é uma área em que cada progresso é importante, porque a indústria procura alternativas que permitam reduzir o consumo de energia e a quantidade de resíduos. O investigador Li Xiaoping (BGI-Research) explica que a equipa já está a realizar testes para determinar quais os enzimas responsáveis por esta decomposição e como se comportam fora do intestino dos animais herbívoros. Este tipo de verificação é crucial para a sua futura utilização em bioprocessos industriais.

Um possível aliado na luta contra o metano na pecuária

A pecuária é responsável por uma parte significativa das emissões globais de metano. No entanto, algumas espécies, como o iaque, produzem muito menos metano do que o gado bovino tradicional. Durante muitos anos, suspeitou-se que a chave para isso estivesse no seu microbioma, mas não havia provas diretas. Durante a investigação, foi possível isolar duas bactérias anteriormente não descritas que, em testes de fermentação realizados com o conteúdo do estômago de vacas, reduziram as emissões de metano em comparação com o grupo de controlo.

Os investigadores planeiam agora realizar testes in vivo, que são a etapa mais complexa, mas também a mais importante, pois podem abrir caminho para suplementos probióticos que reduzem naturalmente as emissões do gado sem afetar a produção. Trata-se de uma solução pouco invasiva que pode ter um enorme impacto quando aplicada em sistemas de pecuária extensiva.

Recurso científico que pode redefinir a biotecnologia

Além das suas aplicações imediatas, este «catálogo microbiano» tem um valor profundo: permite compreender como os sistemas biológicos se adaptam a condições climáticas extremas, flutuações nos níveis de oxigénio e rações vegetais de baixa qualidade. Esses modelos de adaptação contêm dicas importantes para setores em desenvolvimento, tais como:

  • Novos peptídeos antimicrobianos, obtidos a partir de bactérias de ambientes extremos.
  • Compostos biologicamente ativos, úteis na agricultura regenerativa.
  • Enzimas resistentes ao frio ou à radiação, procuradas em bioprocessos e medicina.

E, acima de tudo, o potencial para a descoberta de novos sistemas CRISPR, mais compactos ou específicos do que os existentes. Esta é uma área em rápido desenvolvimento, na qual cada nova proteína pode abrir novas direções tecnológicas.

Potencial

O microcosmo descoberto no planalto tibetano demonstra que ecossistemas remotos podem dar respostas inesperadas a desafios globais. Com uma abordagem responsável ao desenvolvimento, esta área de investigação pode:

Reduzir a pegada climática da pecuária, que é uma das tarefas mais urgentes.

Promover o aumento da eficiência das cadeias de produção através da utilização de enzimas que substituem processos poluentes. Contribuir para novos instrumentos genéticos necessários para melhorar as culturas e criar tratamentos precisos. Estimular modelos de inovação que respeitem a biodiversidade microbiana e promovam a investigação aberta. Em última análise, isto é um lembrete de que a sustentabilidade também depende de olhar para lugares não óbvios. Às vezes, até mesmo para onde menos se quer olhar.

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